quarta-feira, julho 9, 2025
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Imigrantes fortalecem o setor e enriquecem a cultura nos restaurantes

Com histórias de superação e trocas culturais, contratação de imigrantes ganha espaço nos bares e restaurantes brasileiros e se revela uma solução estratégica diante da escassez de mão de obra qualificada

O restaurante Esquina Grill do Fuad, em São Paulo, tem quatro imigrantes de Guiné Bissau em sua equipe.
O restaurante Esquina Grill do Fuad, em São Paulo, tem quatro imigrantes de Guiné Bissau em sua equipe.

A escassez de mão de obra qualificada é um dos principais desafios enfrentados pelos bares e restaurantes no Brasil. Segundo pesquisa da Abrasel, 90% dos empresários do setor relatam dificuldade para contratar — seja pela falta de profissionais com a qualificação adequada ou pelo desinteresse pelas vagas disponíveis. Em meio a esse cenário, cresce uma alternativa promissora: a contratação de trabalhadores imigrantes.

Mais do que preencher lacunas nas equipes, a presença de imigrantes nos estabelecimentos representa uma oportunidade de integração cultural e de fortalecimento do próprio setor. De janeiro a agosto de 2024, mais de 203 mil imigrantes tiveram vínculos formais de trabalho no Brasil, de acordo com o Boletim das Migrações do Ministério da Justiça e Segurança Pública. A maioria das admissões se concentra nas regiões Sudeste e Sul, com destaque para os estados de São Paulo e Santa Catarina.

Diversidade que transforma cozinhas e equipes

No restaurante Esquina Grill do Fuad, em São Paulo, a empresária Lilian Maia convive diariamente com essa realidade. Desde 2015, ela emprega trabalhadores da Guiné-Bissau em sua equipe. “Eu sei como é difícil começar a vida em outro país, com outra língua. Quis dar a mesma chance que tive quando morei na Austrália e fui acolhida lá”, afirma.

As primeiras experiências exigiram ajustes e empatia. Diferenças linguísticas, culturais e religiosas tornaram o início desafiador. “Eles comiam com as mãos e tinham vergonha de fazer isso na nossa frente. Tínhamos que lidar com horários fixos de oração, com a proibição de toque entre homens e mulheres… tudo isso foi sendo adaptado com respeito”, conta Lilian.

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Hoje, a história é outra. Um dos funcionários imigrantes tornou-se líder de cozinha, e a relação entre todos é de confiança mútua. “Eles são extremamente comprometidos. Vieram para trabalhar, crescer e conquistar uma vida melhor. Valorizam muito a oportunidade que têm”, diz.

Além disso, Lilian reconhece o valor da diversidade cultural. “Aprendemos muito com eles. É uma troca. No mês do ramadã, por exemplo, fazemos ajustes de horário. E, mesmo não comendo carne de porco, um deles faz a melhor feijoada que já experimentei. Ele prova o tempero sem engolir”, relata, entre risos.

Do outro lado do balcão: a visão do imigrante empreendedor

Em Macapá (AP), o português Rui Ferreira vive uma experiência diferente. Engenheiro de formação, ele chegou ao Brasil em 2011 e, quase uma década depois, decidiu abrir o restaurante Casa Lisboa, especializado em culinária portuguesa.

“Acredito que o tempo vivendo no Brasil me ajudou a adaptar o negócio. Tropicalizei minhas ideias sem perder a essência”, explica. A proposta conquistou o público local, oferecendo uma gastronomia com sotaque europeu, mas que dialoga com o contexto amazônico. “É possível manter o rigor e a qualidade do país de origem, mas o atendimento precisa estar alinhado com a cultura local”, diz Rui.

O que dizem os especialistas

Para Paulo Illes, uma das principais referências do país em políticas migratórias, o setor de bares e restaurantes pode desempenhar um papel crucial no processo de acolhimento e integração de imigrantes no Brasil. Ex-diretor de políticas migratórias no Ministério da Justiça e hoje à frente do CDHIC (Centro de Direitos Humanos e Cidadania do Imigrante), Illes acompanha de perto os desafios e avanços nessa área.

“Hoje o Brasil conta com instrumentos importantes para a regularização do trabalho de migrantes, como o Acordo de Mobilidade da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) e as permissões para refugiados e solicitantes de visto humanitário. Muitos estão legalizados e aptos a trabalhar — mas há insegurança por parte dos empresários, muitas vezes por falta de informação”, afirma.

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Um dos entraves, segundo Illes, está em casar as vagas disponíveis com os perfis dos imigrantes. “Temos pessoas com mestrado, doutorado, mas que acabam em trabalhos braçais por falta de oportunidades alinhadas às suas competências. O ideal seria criar plataformas para facilitar essa conexão, onde o setor pudesse divulgar vagas e os imigrantes cadastrarem seus currículos.”

O especialista reforça ainda que o setor ganha muito ao acolher a diversidade. “Eles trazem saberes, sabores e um valor agregado imenso. É uma riqueza que muitas vezes não é aproveitada. Além disso, o Brasil está envelhecendo — e os imigrantes podem contribuir com a renovação da força de trabalho.”

Para isso, Illes sugere uma postura mais ativa dos empresários: “É preciso acolher, explicar os costumes e a legislação brasileira, e oferecer condições para que esses profissionais se regularizem. Muitos deixam de correr atrás dos documentos porque não conseguem uma folga para isso.”

Oportunidade que vai além da escassez de mão de obra

Contratar imigrantes não é apenas uma solução para a dificuldade de contratação: é uma escolha estratégica e socialmente responsável. Ao abrir as portas para quem busca recomeçar, bares e restaurantes também se abrem para novas histórias, receitas, repertórios e experiências.

Com políticas públicas mais robustas, boas práticas empresariais e disposição para aprender com o outro, o setor de alimentação fora do lar pode liderar esse movimento. E transformar, mais uma vez, a mesa em um lugar de encontros e possibilidades.


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